Mestres da Humanização
José Mourinho foi o pioneiro, mais tarde surgiu Abel Ferreira. A componente humana é a principal característica do "treinador moderno"?
O treinador moderno é cada vez mais visto, como um gestor de recursos humanos. Além do domínio óbvio da componente tática e do treino, terá que motivacionar constantemente os seus atletas, para a cada vez mais exigente temporada desportiva.
Nos últimos anos, José Mourinho tem sido constantemente confrontado com os seus métodos de trabalho. Muitos diziam que o treinador português estava ultrapassado, outros aguardavam pacificamente pelo fim das temporadas, para fazer uma justa análise e tirar as devidas ilações. Se recuarmos ao passado, Mourinho foi dos primeiros treinadores da Europa a ganhar um balneário por conta do seu psicológico. A vontade intrínseca de ganhar, associada ao poder persuasivo do “Special One”, levou o poderoso Inter de Milão a ganhar o triplete na temporada 2009/2010. Para a história ficou a conquista da Champions League, na final disputada diante o Bayern de Munique. Há poucos anos atrás, Samuel Eto’o em entrevista concedida à Sky Sport Itália, recordou a curiosa palestra de antevisão da partida: “Nesse dia, Mourinho fez o que provavelmente nenhum outro treinador faria. Antes do início da partida discursou e disse ‘agora o Eto’o vai dizer-nos como vamos vencer o jogo’. Essa final foi especial e tenho que agradecer a Mourinho por isso. O Inter não estava naquele patamar há cerca de 40 anos e as emoções foram muitas”, revelou Eto’o. Depois de Mourinho dar a palavra ao camaronês, este recordou o que disse aos colegas. “Vamos ter de morrer naquele campo para trazer a taça. Não vamos voltar para Itália de mãos a abanar”, disse Eto’o.
Abel Ferreira, decerto que inspirou-se em José Mourinho e em tantas outras figuras que cruzaram-se na sua carreira enquanto jogador. Ao contrário do experiente técnico luso, Abel conseguiu almejar o que sonhou enquanto jogador. Atuou nos principais palcos internacionais e chegou mesmo a ser chamado à seleção nacional, sem nunca ter conseguido realizar uma única partida. A componente motivacional e os “mandamentos” que o próprio impõe nas suas equipas são de assinalar:
Respeito, União e Competitividade:
Ataque é criatividade, defesa é organização;
Fazer o certo, nunca é errado;
A alma da equipa é o altruísmo;
Ser a nossa melhor versão;
A estrela é a equipa;
Renúncias e sacrifícios;
Gosto pelo treino e amor pelo jogo;
Todos somos um;
Acreditar sem ver;
E talvez o mais especial de todos: “A vitória é uma espada”.
Segundo Abel Ferreira: “Esta frase fica bem na cabeça e no coração dos jogadores. A vitória é como uma espada: vai-te rachar a meio. É bom que os jogadores sintam isso. Às vezes ficamos empolgados e esquecemo-nos das nossas origens, do nosso trabalho e passamos a viver no mundo da ilusão. É nas derrotas que se processam muitas das grandes aprendizagens.” O lado filosófico e inspirador do treinador, levou-o a conquistar o Palmeiras e todos os amantes do futebol brasileiro. A conquista cada vez mais começa no pré-jogo, nos treinos, nos estágios e nos simples momentos de confraternização. Este processo levou Abel Ferreira, a conquistar 8 títulos em apenas dois anos e meio.
O futebol vive o inevitável avanço tecnológico e o uso imprescindível de recursos técnicos, que auxiliam o staff técnico a retirar o melhor rendimento da sua equipa, contudo é extremamente importante humanizar os intervenientes do jogo. O lado afetivo, solidário e compreensível das necessidades dos atletas é a chave para o sucesso. Um balneário que não respeite o seu líder, dificilmente ganhará jogos. Num mundo tão vil e em que a maldade por vezes impera, José Mourinho e Abel Ferreira são mestres da humanização.